domingo, 9 de janeiro de 2011

Varadouro 17 Peregrinações do Varadouro

Peregrinações do Varadouro
por Elson Martins
Em dezembro de 1979, após imprimir algumas edições na gráfica Dois Oceanos, em Rio Branco, de propriedade do empresário português Carlos Abrantes, a equipe do Varadouro teve que peregrinar novamente em outros estados para imprimir a edição 17. Antes tinha recorrido a Manaus, Brasília e São Paulo. Desta vez, a solução foi encontrada na Neográfica Editora Ltda, localizada à Rua Gaspar Viana, 773, em Belém do Pará.
Em todas as situações em que precisou procurar gráficas em outros estados - porque os podres poderes locais da época (1977 a 1981), incomodados, torciam pelo desaparecimento do jornal - foi fundamental o apoio de periódicos que formavam a rede de imprensa alternativa do país. No eixo Rio - São Paulo, por exemplo, o semanário “Pasquim” comportou-se como grande parceiro. Através de sua editora de livros, a Codecri, mandou para Rio Branco exemplares de seus lançamentos, autorizando que o dinheiro da venda ficasse com o Varadouro.
Em São Paulo, o jornal “Movimento” também deu uma mãozinha divulgando, através de seu pessoal, o alternativo acreano na capital paulista. Em capitais como Belo Horizonte, Brasília, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Fortaleza e Belém, entre outras, tinha sempre alguém ligado a publicações alternativas locais cuidando da distribuição do Varadouro nas universidades e em bancas visitadas por estudantes e militantes. Cidades como Belo Horizonte, Brasília e São Paulo vendiam até 300 exemplares de cada edição. Em Belém, o jornal “Resistência”, capitaneado pelo jornalista Paulo Maklouf, facilitava a vida do alternativo acreano.
Graças a essa rede solidária, naqueles anos de chumbo, o Varadouro foi notícia várias vezes na mídia nacional. E mereceu carta e anúncio no “Pasquim”, assinados pelo genial cartunista Henfil. Também o “Jornal do Brasil”, em reportagem de página inteira sobre a imprensa alternativa brasileira, colocou o nanico acreano em destaque, reconhecendo a linguagem limpa, honesta e corajosa.
Bom, esta edição 17, que está sendo disponibilizada em PDF no site da Biblioteca da Floresta, podendo ser copiada e difundida, contém uma amostragem desse jornalismo despojado, independente e comprometido com os seringueiros, ribeirinhos, índios e posseiros que empreenderam as lutas socioambientais no Acre, impedindo que ocorresse no Estado a devastação amazônica financiada pelo então governo militar.
O destaque da edição são as matérias Operação Pega Fazendeiro I e Operação Pega Fazendeiro II, nas quais são descritos, com clareza, dois conflitos entre fazendeiros e seringueiros ilustrativos da violência perpetrada contra os povos da floresta na época. A Operação I aconteceu nos seringais Guanabara e Icuriã, nas cabeceiras do rio Iaco, no município de Sena Madureira, onde mais de 100 seringueiros aflitos precisaram agir contra uma cooperativa de empresários do Sul que queria passar com motosserra sobre as suas colocações de seringa; na Operação II, no seringal Nova Empresa, nas proximidades de Rio Branco, os posseiros acabaram matando um capataz e seu auxiliar, tendo que passar, depois, maus momentos nas mãos da Polícia e da Justiça.
As 24 edições do Varadouro que formam a coleção completa, aos poucos disponibilizada neste site, geraram e continuam gerando teses e dissertações acadêmicas, deixando sua marca na história acreana. É exemplo de jornalismo engajado na luta dos povos da floresta, em defesa da vida humana e do seu meio ambiente amazônico.
A capa da edição 17 expressa a tendência, naqueles tempos, de substituir o homem pelo boi na floresta acreana. É a reprodução de um quadro do seringueiro artista plástico Hélio Melo - autodidata primitivo e surrealista, - que pintou com traços definitivos a crueldade e burrice dos invasores que agiam em nome de um progresso absurdo.

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