quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O VARADOURO EDIÇÃO 24

Varadouro 24: missão cumprida
 
Elson Martins
Um pé de maconha em fotografia arregaçada na capa do jornal? Só o jornal Varadouro tinha tanta ousadia! Afinal, o ano era 1981, o país ainda vivia sob uma ditadura militar e o Acre – meu Deus! – que garantia podia oferecer a um grupo de jornalistas que há quatro anos cutucava a onça com vara curta? Mas estava lá, na capa da edição 24 (a última) que circulou em dezembro, a matéria com o título “Maconha: ilusão ou busca”?
Por que maconha na capa do Varadouro? – indagam os próprios editores do jornal pensando na explicação que queriam dar no pequeno editorial (sempre disfarçado de “neste número”) na segunda página:
“Em primeiro lugar, porque para nós não existem temas proibidos. Todos os assuntos de importância social são tratados com franqueza e coragem”. O jornal informa que a maconha joga milhares de jovens na marginalidade e nas garras da polícia, e que em Rio Branco teriam sido presos 100 fumantes entre janeiro e outubro daquele ano.
Na pagina 6 a matéria é desenvolvida com o título: “Por que se fuma maconha? E são os usuários que respondem: uma universitária, uma funcionária pública e um artista deram depoimento falando de suas experiências com a droga. Claro, sem serem identificados. A fotografia que ilustra a matéria mostra uma jovem caminhando junto a um muro onde se lê a pichação: “Cresça, faça a cabeça”! Na contracapa da edição, mais provocação: o desenhista Branco faz uma viagem pelo “Dai-me astral”.
No mais, era o Varadouro de sempre, com destaque para a matéria das páginas centrais: “O que o acreano espera de 82”, ou seja, qual a expectativa da população sobre as eleições daquele ano? A secretária da associação das lavadeiras de Rio Branco, Maria Costa dos Santos, nascida em Sena Madureira, 30 anos e 10 filhos, dá uma resposta consciente e engajada: “Estou confiante não por causa dos políticos, mas por causa do povo”.
Na página 18 tem uma matéria que até hoje sugere reflexão: “Seringueiro não vira colono paranaense”. Nas assembléias dos seringueiros organizados em sindicatos a partir de 1975, era comum ouvir-se que eles não queriam trocar sua colocação de seringa dentro da mata, com 300 hectares de floresta, por um lote do Incra de 100 ou menos, voltado para a produção agrícola. Anos depois (1990) eles conquistariam as Reservas Extrativistas.
Desta forma, com brilho, Varadouro fechou seu curto ciclo de vida. Mas seus editores nunca imaginaram que aquela edição era a última, como bem observou o sociólogo Pedro Vicente Costa Sobrinho, no seu livro Comunicação Alternativa e Movimentos Sociais na Amazônia Ocidental (2001). Segundo ele, Varadouro estava fadado a acompanhar o destino dos irmãos alternativos do resto do país. “Na notícia do desaparecimento do jornal Movimento, que foi veiculado neste número 24, Varadouro cometeu uma grave omissão: deixou de também incluir no texto o seu próprio desaparecimento, pois a partir daí sumiu sem uma explicação para o seu público” – escreveu.

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