domingo, 31 de agosto de 2014

Eu tenho dó dela', diz goleiro Aranha sobre jovem que o ofendeu em jogo

Edição do dia 31/08/2014
31/08/2014 22h33 - Atualizado em 31/08/2014 23h41

'Eu tenho dó dela', diz goleiro Aranha sobre jovem que o ofendeu em jogo

'Às vezes a gente deixa passar, finge que não ouve, mas por dentro dói', diz Aranha. Goleiro do Santos desabafa sobre ofensas sofridas em partida.

Aos 33 anos de idade, com 15 de futebol profissional, ele se viu acuado no estádio. O goleiro Aranha, do Santos, foi ofendido por torcedores do Grêmio na quinta-feira (28).
O time identificou cinco agressores até agora. Patrícia Moreira acabou se tornando um símbolo deles. Confira no vídeo acima a íntegra da entrevista com o goleiro.

Aranha: Eles vinham na muretinha como se fossem saltar e vir para cima e eu estava preparado.
Fantástico: Para quê?
Aranha: Para o que der e viesse.
Fantástico: Você achou que eles iam te atacar?
Aranha: Sim, por que não? A raiva que eles estavam, porque eles ficaram mais nervosos porque eles acharam que como a maioria faz, como eu mesmo já fiz várias vezes ali, até mesmo ano passado, a gente escuta e finge que não ouve.
Na quinta-feira, Aranha não fingiu. “E aí quando eles começaram a emitir som de macaco, aí eu não tive dúvida, aí eu não aguentei. Aí eu falei: ‘Ah, vou ter que estourar, é agora, não tem jeito’. Porque às vezes a gente tem que dar uma de louco, como a gente fala, senão ninguém presta atenção, ninguém te escuta”, conta o goleiro.
Fantástico: Você já tinha passado por essa situação?
Aranha: Centenas e milhares de vezes. No futebol isso infelizmente é normal.
Aranha diz que o problema é de todos. “Sempre quando acontece de acontece briga no estádio, esse negócio de racismo, de vandalismo, aí a gente costuma dizer, os clubes e todo mundo costuma dizer, ‘não são torcedores, é a minoria’. Mas a minoria manda? Se tinha duas mil pessoas ali atrás e cinco estavam tomando essa atitude, por que as outras pessoas não cobraram delas uma postura melhor?”, questiona Aranha. 
O Grêmio, que ainda pode ser punido até com a exclusão da Copa do Brasil, identificou cinco agressores até agora. Patrícia Moreira acabou se tornando um símbolo deles.

Fantástico: O que você achou dessa moça, quando você viu ela falando 'macaco', e aquela imagem bem fechada nela.
Aranha: Eu tenho dó dela. Como ser humano, e pelas consequências.
Patrícia perdeu o emprego, a casa dela foi apedrejada e ela deve depor nessa segunda-feira (1º) na polícia de Porto Alegre.
Aranha diz que aprendeu a enfrentar o preconceito ouvindo rap. Confira no vídeo ao lado mensagens de apoio a Aranha e contra o racismo.
“Eu tive a felicidade de aprender muito com o rap, porque esse pessoal, como sempre foi um pessoal sofrido e acusado e agredido. É um pessoal bem informado sobre política, sobre religião, sobre a sua história, a história do seu país. Como na periferia a gente ouve muito isso, porque é aquilo que está na nossa realidade, eu cresci preparado para esse tipo de situação”, diz Aranha. 
Fantástico: Fora dos estádios você também tem problema? Sofre com o racismo?
Aranha: Tem, tem. Isso aí muita gente tem. A gente vale o que tem. Ou o nome que tem. Eu sei que muitas vezes eu não sou aceito, eu sou tolerado. Porque sou o goleiro do Santos, bicampeão mundial. E porque eu tenho um carro bonito, porque eu compro isso, eu compro aquilo. Então muitas vezes eu sou tolerado, não sou aceito. Eu já morei em prédios, minha família está de testemunha, que não me davam nem bom dia.
Fantástico: A sua família acaba sendo atingida também, sofre com isso tudo, o teu enteado. Meu filho, é. Ele acabou colocando que tem orgulho de ter um pai negro.
Bernardo Maron, enteado de Aranha: Eu estava assustado, triste, porque eu não esperava que ainda esse pensamento ainda estava na cabeça das pessoas, pensava que tinha acabado.

Na noite de quinta, Bernardo, de 13 anos, entrou em uma rede social para dar apoio ao pai. “Eu fiquei quietinho na minha aí eu fui lá e pensei em escrever isso: ‘Eu já cansei disso, que isso é uma palhaçada e que eu tenho orgulho de ter um pai negro’”, conta ele.
Depois, telefonou para ele. “Eu falei: ‘força, pai, eu te amo’”, conta o menino.
“A gente já prepara uma conversa antes porque sabe que no próximo dia de escola vai ter aquela polêmica, ‘nossa, o que aconteceu com o seu pai’, só que graças a Deus eles são muito maduros, o futebol amadureceu até os meus filhos”, diz Juliana Costa, mulher de Aranha.
Na manhã seguinte, em um comunicado, Aranha citou um discurso de Martin Luther King, o famoso ativista americano assassinado em 1968 que lutou pela igualdade racial.
“Eu citei um trecho do Martin Lutther King, "I Have a Dream", que ele fala que ele tem um sonho que todas as pessoas fossem julgadas não pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter”, diz o jogador.
Fantástico: Nos estádios, qual seria a punição para que isso não voltasse a se repetir?
Aranha: Essa mocinha aí, nunca mais pisar na Arena. Porque outras pessoas vão falar 'se eu tomar uma atitude dessas, se eu for flagrado, eu nunca mais vou acompanhar o time que eu gosto'. O futebol está caminhando para um lado de empresa, de espetáculo, mas as pessoas que vão assistir têm que se comportar como tal. Eu acho que a principal punição tem que ser essa, da pessoa nunca mais pisar no estádio, em um lugar público, porque ela me xingou ali, mas tinha vários outros negros ali.

Falta d'água em cidades tem a ver com devastação desenfreada da Amazônia

Edição do dia 31/08/2014
31/08/2014 22h31 - Atualizado em 31/08/2014 22h31

Falta d'água em cidades tem a ver com devastação desenfreada da Amazônia

Chuvas que recarregam reservatórios da região Sudeste são oriundas da Amazônia. Árvores são ‘toque final’ da máquina biológica que produz chuvas.

O chão foi o destino de 20% das árvores da Floresta Amazônica original. Que isso vem acontecendo há anos, todos sabem. O que você provavelmente não sabe é que esse crime ambiental tem a ver com a falta d'água na maior cidade da América Latina. É que a Amazônia bombeia para a atmosfera a umidade que vai se transformar em chuva nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil. Quanto maior o desmatamento, menos umidade e, portanto, menos chuva. E sem chuva, os reservatórios ficam vazios e as torneiras, secas.
É guerra contra a cobiça. No coração da Amazônia, o exército formado pelo Ibama, pela Funai e pela Polícia Federal atinge mais um alvo. Garimpeiros presos, madeireiros multados, equipamentos destruídos. E a prova do crime apreendida. Esse é o front de um conflito que já dura pelo menos quatro décadas no Brasil. Desde que as primeiras estradas rasgaram a floresta para permitir a colonização. Caminhos que acabaram facilitando também o acesso de exploradores gananciosos e sem escrúpulos. Um crime ambiental que ainda está longe do fim.
Uma árvore que leva mais de 100 anos para crescer. E que em menos de um minuto, já pode estar derrubada. E o pior é que a madeira nem é aproveitada. Nesse tipo de desmatamento, o objetivo é simplesmente derrubar tudo, tocar fogo e transformar a área em pastagem para a criação de gado. Um crime ambiental que geralmente só é notado pelos fiscais tarde demais, quando a floresta já virou carvão.
Clareiras somam área maior que França e Alemanha juntas
“Isso aqui é roubo de terras da União. Grileiros furtam a terra da União, praticam o desmate multiponto, vários pontos embaixo da floresta, dificultando o satélite de enxergá-lo.”, explica Luciano de Menezes Evaristo, diretor de proteção ambiental do Ibama.
O que os olhos poderosos dos satélites não veem, a floresta, lamentavelmente, sente: 20% das árvores da Amazônia original já foram para o chão. Restaram imensas clareiras que somam uma área maior que a França e a Alemanha juntas.
O Fantástico acompanhou, com exclusividade, a maior operação contra grileiros na Amazônia neste ano. Em uma conversa gravada pela Polícia Federal com autorização da Justiça, um dos presos admite que o interesse dos criminosos é apenas nas terras.
“Como a floresta lá é muito bruta, os troncos são muito grossos, então o custo é muito grande. São árvores antigas, árvores velhas”, ele diz.
Consequências da devastação estão próximas de todos
Derrubadas e garimpos deixam uma cicatriz gigantesca na mata que pode parecer um problema exclusivo de árvores e bichos, distante da maioria das pessoas. Mas a ciência e as novas tecnologias comprovam que as consequências da devastação estão muito mais próximas de todos nós.
Nascentes que já não vertem mais água. Represas com menos de 10% de sua capacidade original de armazenagem. Uma delas, por exemplo, perto de Mogi das Cruzes, no interior de São Paulo, deveria ter em um ponto uma profundidade de pelo menos cinco metros. Está agonizando. Mas o que a falta de água nesta região do país tem a ver com a Amazônia que fica a mais de 2 mil quilômetros de distância? Tudo, absolutamente tudo, segundo cientistas que estudam as funções da floresta e as variações climáticas na América do Sul.
“Essas chuvas que ocorrem principalmente durante o verão, a umidade é oriunda da Amazônia. E essa chuva que fica vários dias é que recarrega os principais reservatórios da Região Sudeste.” explica Gilvan Sampaio, climatologista do Inpe.
Fantástico tem acesso exclusivo a relatório sobre futuro climático
O Fantástico teve acesso exclusivo ao relatório sobre o futuro climático da Amazônia que só vai ser divulgado oficialmente na Conferência Sobre o Clima em Lima, no Peru, no fim deste ano. O trabalho desenvolvido em parceria por cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e do Inpa, que investiga a Amazônia, reúne mais de 200 estudos e traça um minucioso roteiro das chuvas no continente sul-americano.
“Está mudando o clima. A gente vê isso acontecendo na Amazônia. Tem muitos trabalhos mostrando que a extensão da estação seca está se prolongando”, diz Antônio Nobre, pesquisador do Inpa.
De acordo com esse relatório, nos últimos 400 milhões de anos, a umidade que evapora dos oceanos é empurrada naturalmente pelos ventos para dentro dos continentes. Uma parte desse vapor vira chuva e cai, principalmente, sobre as grandes florestas na altura do Equador. O excesso de umidade segue empurrado pelos ventos, atravessa os continentes e acaba indo para o mar. Um ciclo que ao redor da Terra só tem uma exceção: a Amazônia.
Diferencial da Amazônia
O que torna a Amazônia diferente de todas as grandes florestas equatoriais do planeta é a Cordilheira dos Andes. Um imenso paredão, de 7 mil metros, que impede que as nuvens se percam no Pacífico. Elas esbarram na Cordilheira e desviam para o Sul.
“Esses ventos viram aqui e se contrapõem à tendência natural dessa região aqui de ser deserto. É uma região que produz 70% do PIB da América do Sul - região industrial, agrícola, onde está a maior parte da população da América do Sul”, explica Antônio Nobre, pesquisador do Inpa.
Mas de onde vem tanta água? Como funciona a fantástica máquina biológica que faz chover? Segundo os cientistas, o toque final cabe às árvores.
Fincadas a até 20 ou 30 metros de profundidade, as raízes sugam a água da terra. Os troncos funcionam como tubos. E, pela transpiração, as folhas se encarregam de espalhar a umidade na atmosfera.
Diariamente, cada árvore amazônica bombeia em média 500 litros de água.
A Amazônia inteira é responsável por levar 20 bilhões de toneladas de água por dia do solo até a atmosfera, 3 bilhões de toneladas a mais do que a vazão diária do Amazonas, o maior rio do mundo.
“Se você tivesse uma chaleira gigante ligada na tomada, você precisaria de eletricidade da Usina de Itaipu, que é a maior do mundo em potência, funcionando por 145 anos para evaporar um dia de água na Amazônia. Quantas Itaipus precisaria para fazer o mesmo trabalho que as árvores estão fazendo silenciosamente lá? 50 mil usinas Itaipu”, explica Antônio Nobre.
“Rio voadores” cruzam o Brasil
Esse imenso fluxo de água pelos ares é chamado de "rios voadores". O Fantástico chamou a atenção para a importância desses rios já em 2007. Imagens feitas de um avião do projeto "rios voadores" revelam nuvens densas, carregadas de água, cruzando todo o Brasil.
Testes feitos em laboratório comprovaram: mais da metade da água das chuvas nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil e também na Bolívia, no Paraguai, na Argentina, no Uruguai e até no extremo sul do Chile vem da Amazônia.
Para os cientistas, uma prova irrefutável do papel dos Andes e da Floresta Amazônica no ecossistema do cone-sul é a inexistência de um deserto nessa região. Basta olhar o globo para constatar que na mesma latitude em volta do planeta tudo é deserto. Menos na América do Sul.
Os pesquisadores não têm dúvida: sem a Amazônia, os estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul fatalmente seriam desertos também.
“Para quem está no Brasil, seja Porto Alegre ou Manaus ou São Paulo tem que saber que a água que consome em sua residência, uma parte dela vem da Amazônia e que por isso temos que preservar”, alerta Gilvan Sampaio.
Devastação bloqueia “rios voadores” em São Paulo
As imagens dos satélites que acompanham a movimentação das nuvens de chuva comprovam que a grande seca que assola as regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, em parte, está relacionada aos desmatamentos. No estado de São Paulo, por exemplo, a devastação da Mata Atlântica permite a formação de uma massa de ar quente na atmosfera. Tão densa que chega a bloquear os “rios voadores”, já enfraquecidos por conta do desmatamento na Amazônia. Represados no céu, eles acabam desaguando no Acre e em Rondônia, onde, este ano, foram registradas as maiores enchentes da história.

MP e Receita Federal entram na luta contra o desmatamento
Na luta contra o desmatamento, o Ibama, a Funai e a Polícia Federal acabam de ganhar mais um aliado: o Ministério Público, que passou a juntar dados da Receita Federal para poder enquadrar as quadrilhas também por lavagem de dinheiro e sonegação fiscal, falcatruas que podem levar a mais de 10 anos de cadeia.
Pelas contas da Procuradoria da República no Pará, só a quadrilha presa na última operação desviou dos cofres públicos R$ 67 milhões em impostos. Um crime que mistura ganância e ignorância.
Fantástico: Quando você mete a motoserra em uma árvore que levou 100 anos para chegar daquele tamanho, não dá dó?
Homem: Não tem como a gente ter dó das coisas. Ninguém tem dó da gente também, né? Tem que desmatar para viver, né?
“Eu não sei se tá errado, não. Pra mim, está certo porque eu estou trabalhando. Enquanto os vagabundos ficam soltos na cidade, a gente tem que trabalhar escondido. Aí é difícil”, diz uma mulher.
Reflorestar áreas desmatadas antes que seja tarde
Um comportamento que bate de frente com os interesses de quem depende da Amazônia para produzir alimentos de forma legal.
“É do interesse do próprio agricultor ou produtor de gado ou de quem está querendo produzir energia que a floresta seja mantida. Porque ela é o que garante que tenha água necessária para essas atividades econômicas poderem existir”, diz o engenheiro florestal Tasso Azevedo.
Os gráficos do Inpe revelam que os desmatamentos na Amazônia já caíram aos níveis mais baixos das últimas duas décadas, mas ainda que tivessem sido completamente zerados, os cientistas não estariam tranquilos. Eles alertam que é preciso também reflorestar as áreas desmatadas antes que seja tarde.
“Existe um fato simples: se você tira floresta, você tira fonte de umidade, muda o clima. E nós tiramos floresta. Isso foi o que a gente fez nos últimos 40 anos. O clima é um juiz que sabe contar árvores, que não esquece e não perdoa”, afirma Antônio Nomes

TRISTEZAS NÃO PAGAM DÍVIDAS

TRISTEZAS NÃO PAGAM DÍVIDAS
 
Um garoto de 4 anos seguia descalço por uma rua, chupando um picolé num palito. Nesse tempo picolé era um artigo raro. De repente, um grupo de meninos mais velhos passou correndo pela esquina, derrubando o pequeno na corrida, e o picolé caiu no chão se quebrando todo. O Menino sentou-se no chão, e ficou, de olhos arregalados, contemplando a resultado da tragédia. Não sabia o que dizer: só uma tristeza muito grande o dominava.
Uma Senhora idosa vinha nesse momento pela rua e caminhou para a Criança.
- Bem, meu pequeno, disse ela, o pior que podia haver, aconteceu a você. Mas levante-se, que eu vou lhe mostrar uma coisa.
O pequenino ergueu-se.
- Agora ponha seu pé direito em cima do picolé, pise com força, e repare como ele se esguicha entre os dedos do seu pé.
O Menino pisou com força o picolé, e este espirrou entre os dedos do pé. A Senhora riu e disse:
- Aposto que não há nenhum outro menino na cidade que já tenha coçado os dedos do pé com sorvete. Corra agora para casa e conte a sua mãe como foi divertida a experiência. E, lembre-se, acrescentou ela, por pior que seja uma coisa que lhe aconteça, você pode se divertir quase sempre à custa dela!

Feliz

 
“Você quer ser feliz por um instante? Vingue-se. Você quer ser feliz para sempre? Perdoe.”
(Tertuliano)
 

Refletir




 
“Todo o bem que eu puder fazer, toda a ternura que eu puder demonstrar a qualquer ser humano, que eu os faça agora, que não os adie ou esqueça, pois não passarei duas vezes pelo mesmo caminho.” (James Greene)
 

Acabar com o voto obrigatório é uma tendência das grandes democracias”

Acabar com o voto obrigatório é uma tendência das grandes democracias”

Por Livia Scocuglia31/08/2014 09:07:18
  
Criar um partido político no Brasil é fácil. Essa é a conclusão à qual se chega ouvindo o procurador regional eleitoral de São Paulo, André de Carvalho Ramos, falar sobre a inexistência de uma cláusula de barreira e de qualquer punição para o mandatário que muda de partido. Ele critica a  fragmentação partidária, consequência da facilidade de criar partidos políticos no país.
Os países que aceitam essa “ampla liberdade partidária”, diz ele, contam com cláusulas de barreira ou com a exigência de número mínimo de votos para conseguir uma cadeira, “que é uma cláusula de barreira disfarçada”. Em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico, o procurador afirma que um dos maiores problemas da eleição são o voto às cegas, relacionado ao coeficiente eleitoral, e a infidelidade partidária.
Ramos defende que partidos só poderiam ser criados, se apresentassem propostas diferentes dos demais. “Se temos coligação proporcional, então essas diferenças não existem. No país, ocorre simplesmente uma acomodação de interesse para criar tantos partidos”, afirma.
O país passa hoje pela segunda eleição com a vigência da Lei da Ficha Limpa, mas o desafio continua o mesmo: agir dentro do prazo legal. Pela norma, a partir da data do registro da candidatura, as procuradorias têm cinco dias para propor as ações contra os candidatos aspirantes ao cargo público, isso é, ações contra os “fichas sujas”.
O procurador aponta que, em 2012, o país teve 85 mil candidatos na eleição e aproximadamente 350 candidatos cujo registro foi indeferido com base na Lei da Ficha Limpa. Com a norma, o candidato deve se preocupar com a vida pregressa e com as consequências de ignorar a legislação e as exigências eleitorais. “A Ficha Limpa tem um efeito claro prático que é barrar efetivamente esses fichas sujas, mas, do meu ponto de vista, tem um efeito virtuoso ao longo do tempo que é chamar a atenção das exigências de uma candidatura”, afirma.
André de Carvalho Ramos é experiente em matéria eleitoral. Desde 2010 atuando com exclusividade na área, foi procurador auxiliar, vice-procurador eleitoral e está no segundo mandato como procurador regional eleitoral do estado. “Vim da área dos Direitos Humanos com a intuição que parte importante da não implementação de direitos no Brasil diz respeito ao Direito Eleitoral”, defende.
É autor de várias obras, a maioria relacionada a Direitos Humanos, entre elas oCurso de Direitos HumanosTeoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional Direitos Humanos na Integração Econômica. Atua como professor e livre-docente de Direito Internacional e do Programa de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. É livre-docente e doutor em Direito Internacional pela mesma faculdade. Ramos fica no cargo até 2016.
Leia a entrevista:
ConJur – O Ministério Público interfere demais nas eleições?
André de Carvalho Ramos – Não. O Ministério Público provoca o Judiciário, por isso que essa Justiça Eleitoral é indispensável. As cassações de prefeitos e vereadores ocorreram porque foram provados casos gravíssimos. Permitir que alguém que alterou o resultado das urnas de modo ilícito permaneça no poder é um grave atentado à democracia. Isso estimula novas anulações da regra eleitoral. O esforço do Ministério Público Eleitoral é, cada vez mais, ter transparência e obter informações que a sociedade clama. A Lei da Ficha Limpa veio de iniciativa popular, e mais interessante, foi aprovada, em unanimidade, pelos partidos. Então os políticos nos apoiam, mostrando que quem comete ilegalidade é uma pequena fração. Para os bons políticos, a atuação do Ministério Público e da Justiça só é benéfica.
ConJur – Há um exagero na imputação de atos por improbidade administrativa?
André de Carvalho Ramos –
 Se compararmos o número de gestores públicos do Brasil, em que 30% do PIB brasileiro é gasto na máquina pública, com os casos de agentes condenados por improbidade, ou número de ações de improbidade promovidas não destoa. Precisamos comparar com a realidade brasileira. A intervenção do Estado é muito forte na nossa economia, o que faz com que vultosos recursos sejam geridos e com base em princípios do Direito Administrativo brasileiro, porque são realmente muito severos. Eu entendo não ser um exagero.
ConJur – Existe mais corrupção hoje do que no passado?
André de Carvalho Ramos –
 Não. Mas eu entendo que hoje há mais órgãos de controle, tem o Ministério Público, tem alguns instrumentos previstos na legislação, tem dependência que possibilita a interposição de ações. Muitas vezes, o próprio poder executivo se estrutura e consegue detectar fraudes e desvios.
ConJur –  Qual é o perfil dos candidatos de hoje do Brasil? O que a Lei da Ficha Limpa mostrou em relação a moralidade pública?
André de Carvalho Ramos –
 A Ficha Limpa é um farol, um norte. Em 2012, o país teve 85 mil candidatos na eleição e aproximadamente 350 candidatos cujo registro foi indeferido com base na Ficha Limpa. Então não é muito. Com a Ficha Limpa, o candidato tem de se preocupar com a sua vida pregressa. O gestor agora se preocupa também com as consequências de ignorar a legislação. Ocorre a inelegibilidade, porque rejeição de contas é irregularidade insanável e configura ato doloso e improbidade administrativa, imposição do TSE. A Ficha Limpa tem um efeito prático que é barrar efetivamente esses fichas sujas, mas, do meu ponto de vista, tem um efeito virtuoso ao longo do tempo que é chamar a atenção das exigências de uma candidatura.
ConJur – Deveria existir uma cláusula de barreira para limitar o número de partidos políticos no Brasil?
André de Carvalho Ramos –
 É possível pensar de maneira comparativa e verificar que em vários países do mundo há uma ampla liberdade partidária, só que essa liberdade vai gerar naturalmente a permanência de alguns partidos ou a vida extra parlamentar de outros. O que dificulta no Brasil é a existência de fragmentação partidária, porque é muito fácil criar partido; a lista de apoiamento são pessoas que sequer comungam de uma mesma ideologia, é um título de eleitor que se pede e há uma comprovação administrativa.
É lícito dizer que a criação de partidos no Brasil é facilitada. Não existe cláusula de barreira, não há sequer punição para que o mandatário saia de um partido e vá para um novo partido. Ao mesmo tempo, não temos o que normalmente países que aceitam essa ampla liberdade partidária, que é ou a cláusula de barreira como existe na Alemanha, ou simplesmente gerando uma divisão, um número mínimo de votos para que você consiga uma cadeira só, que é uma cláusula de barreira disfarçada. Nós não temos uma cláusula de barreira efetiva no Brasil porque o Supremo considerou inconstitucional e nós temos ainda a possibilidade de coligação proporcional, então estimulamos a fragmentação de partidos e essa fragmentação estará mimetizada no parlamento. O que em alguns países do mundo não acontece.
ConJur – Como a Justiça Eleitoral pode ser mais ágil para julgar a candidatura de políticos que tem chance de serem cassados depois de serem eleitos?
André de Carvalho Ramos –
 Essa é uma questão de tensão entre a ampla defesa e o contraditório. A lei fala que as ações cassatórias devem ter o seu trânsito em julgado em um ano, mas é óbvio que esse prazo é muito difícil, até porque há recursos que demoram. Nas eleições gerais fica mais condensado, porque os julgamentos de todas essas ações cassatórias são do Tribunal Regional Eleitoral e depois com recurso ao Tribunal Superior Eleitoral. Mas efetivamente precisamos avançar bastante nisso e dar prioridade a essa questão.
ConJur – A Justiça Eleitoral precisa de mais juízes?
André de Carvalho Ramos –
 Existem tribunais com apenas sete juízes que foram pensados para uma época de uma intervenção administrativa em 1988, e 25 anos depois eles se comportam como tribunais com uma forte característica jurisdicional. O TRE de São Paulo é o maior colégio eleitoral do país, com cerca de 32 milhões de eleitores, o dobro do segundo maior colégio, que é Minas Gerais. O TSE tem só seis ministros. Eu compreendo que a celeridade é uma preocupação, mas o desejo das eleições limpas gera a necessidade de punir quem viola a lei, e a punição no Brasil tem que ser feita com o devido processo legal e o contraditório. Ao todo, são 425 zonas eleitorais no estado de São Paulo, 600 municípios; então como exigir que tudo isso esteja com trânsito em julgado em um ano, no caso de eleições gerais, só com sete juízes? Eu não vejo a população diminuir o seu desejo por mais lisura, transparência, ao contrário; há projetos para que as eleições sejam o mais justas o possível, então isso vai ter que gerar uma reflexão sobre a estrutura da Justiça Eleitoral.
ConJur – O Brasil precisa da reforma política? O que o doutor acha das propostas?
André de Carvalho Ramos –
 O sistema eleitoral brasileiro merece reflexão, mas devemos analisar aquilo que se espera de um Direito Eleitoral contemporâneo. O Direito Eleitoral na democracia serve para transformar a vontade do eleitor em mandatos, se tem dificuldade nisso, ele merece reforma. Hoje há o problema do voto às cegas, você vota em uma pessoa e elege outra. Um segundo ponto é a infidelidade partidária. Em 2012, propusemos as ações de infidelidade partidária. O partido tem que propor a ação e, se o partido se fizer inerte por 30 dias, cria-se para os próximos 30 dias subsequentes a legitimidade subsidiária do suplente ou da Procuradoria Regional Eleitoral. Então a procuradoria entrou com várias ações, mas nitidamente há um número muito grande dessas infidelidades.
A democracia do país é partidária, não há candidatura avulsa. Ao mesmo tempo, sabemos o que é impedido. O fato do eleitor votar em um candidato e eleger outro, porque, em tese, está votando na coligação proporcional, que é o chamado voto às cegas, gera uma distorção.
ConJur – Há tantas visões de mundo distintas no Brasil, ou a existência dessa multiplicidade de partidos é gerada pelo Direito Eleitoral?
André de Carvalho Ramos – Eu não acho que temos 32 propostas diferentes para o Brasil. O que existe é uma legislação que estimula a fragmentação. Para o partido político existir, é preciso apresentar propostas distintas dos demais. Se nós temos coligação proporcional, então essas diferenças não existem. No país, ocorre simplesmente uma acomodação de interesse para criar tantos partidos.
ConJur – Por que o doutor escolheu atuar na Justiça Eleitoral?
André de Carvalho Ramos –
 Toda minha atuação é na área de Direitos Humanos. Eu fui procurador regional do direito do cidadão no estado de São Paulo, dou aula na USP em Direitos Humanos. Eu vim da cidadania, dos Direitos Humanos, justamente com a intuição que parte importante da não implementação de direitos no Brasil diz respeito ao Direito Eleitoral. É preciso verificar o porquê de tanta dificuldades de mudança em algumas áreas do Brasil. E isso merece algumas reflexões sobre fidelidade partidária, como é feita a divisão das circunscrições no Brasil e qual é o papel efetivamente da chamada lista aberta.
ConJur – Uma de suas preocupações quando assumiu o cargo de procurador foi tentar garantir o cumprimento das cotas por gênero em relação ao total de candidatos registrados por partido. O que foi já foi feito nesse sentido?
André de Carvalho Ramos – Nesses dois anos de mandato, nós nos pautamos pela defesa das ações afirmativas de gênero. Em 2012, tivemos uma audiência pública sobre a chamada cota de sexo. A norma que diz que os partidos políticos devem ter no mínimo 30% de um sexo só foi implementada nas eleições de 2012 e hoje a sanção no caso de descumprimento é gravíssima. A cota só é aplicada para as chapas proporcionais e se o partido não cumpre, a chapa cai. Em geral, o gênero feminino é o sub-representado e em São Paulo nós tivemos 32% de representação feminina nos partidos; então cumprimos, mas ocasionalmente em alguns municípios não cumpriram e a chapa caiu.
ConJur – Cinco porcento da propaganda partidária deve estar associada à difusão e à participação feminina na política. Como é feita a fiscalização?
André de Carvalho Ramos – A fiscalização é muito difícil, porque, em geral, os partidos têm 20 minutos de propaganda partidária. É preciso acompanhar todas as campanhas que podem ser diferentes em cada cidade. A primeira vez que eu chamei um assessor para mostrar como a fiscalização deveria ser feita, ele me olhou como se eu tivesse falando para ele nadar daqui até a África. Obviamente, é muito difícil. A primeira condenação aconteceu em 2012 pelo Tribunal Regional Eleitoral em São Paulo.
ConJur – Qual é a punição dos partidos?
André de Carvalho Ramos – Os partidos perdem cinco vezes o tempo desvirtuado na campanha eleitoral. Todas as ações foram promovidas pela Procuradoria e quem é co-legitimado também é o partido, ou seja, há momentos em que a atuação de um ente imparcial, independente, é indispensável.
ConJur – O período eleitoral impõe uma série de restrições para a administração pública. Como evitar que isso não seja um empecilho para o funcionamento do Estado?
André de Carvalho Ramos – É preciso fazer uma ponderação entre os diversos valores envolvidos. De um lado, a máquina funciona e tem que funcionar os quatro anos, mas, por outro lado, também temos de evitar que a máquina seja apropriada para a defesa de uma candidatura. Essas restrições não são, em hipótese alguma, grandes embaraços, ao contrário, restrições em relação à publicidade institucional no período dos três meses são o mínimo. Quanto às restrições envolvendo gastos de publicidade que tem que acompanhar a média e a vedação na participação de inauguração, tendo em vista que é ambiente de reeleição, estão bem razoáveis.
O Direito Eleitoral estabeleceu algumas restrições, mas que não são um empecilho. Discute-se ainda que deveria ter alguma melhoria, algum implemento nessas restrições. A minha preocupação hoje diz respeito à conduta vedada, ao abuso, ao uso de servidor público durante o expediente na campanha, desvirtuamento da publicidade institucional… Essa é a nossa preocupação da chamada queimada de largada, que é esse momento em que sequer a propaganda é permitida.
ConJur – Como evitar que as restrições à campanha antecipada não ofendam a liberdade de imprensa e de expressão?
André de Carvalho Ramos – O objetivo da proibição da propaganda antecipada é ter um marco claro para que todos possam partir do mesmo ponto. A liberdade de expressão do candidato e da população em geral não é afetada. O que podemos refletir é se esse desejo do legislador em fixar a campanha em três meses tão somente atingiu o objetivo que é de reduzir os gastos em campanha, porque os gastos são altíssimos e não há lei que tenha estabelecido limite. A lei nunca foi editada e enquanto ela não existir, cada um estabelece o seu próprio limite.
ConJur – A lei teria impacto na liberdade de expressão?
André de Carvalho Ramos – Não é uma questão de liberdade de expressão, mas uma questão de igualdade e entendo que talvez não geraria grande impacto a mudança do marco. Como órgão de fiscalização do estado independente, é óbvio que eu tenho o dever de interpor ação contra campanha antecipada e fiz de vários políticos. Entrei com várias ações, inclusive de desvirtuamento de propaganda partidária, até porque a propaganda partidária é paga com dinheiro público e a propaganda eleitoral antecipada não serve para a promoção pessoal. Não vejo, então, nenhuma restrição de liberdade de expressão.
ConJur – E quanto à liberdade de imprensa?
André de Carvalho Ramos – Também não. A procuradoria tem uma interpretação sempre para valorizar a liberdade de expressão.
ConJur – Como a Justiça Eleitoral vai monitorar as manifestações via internet?
André de Carvalho Ramos – A internet é regida pela Lei Eleitoral desde 2009. O vetor inicial é a liberdade na rede, mas essa liberdade, tal qual no mundo real, tem limites que envolvem os outros direitos, como a igualdade. Veda-se a campanha antecipada também no mundo virtual. O que a legislação combate muito na internet é a manipulação da liberdade na rede, o uso dos perfis falsos, criação de sites somente para fim de caluniar e difamar.
ConJur – Como é feita a monitoração?
André de Carvalho Ramos – Agora vamos para a questão da implementação, que é o desafio não só no campo virtual, mas em todo Direito Eleitoral. Se não combatermos corrupção eleitoral não tem democracia. Então, não há como implementar a monitoração sem o apoio da sociedade. Por isso no site da PRE-SP há um link para receber as notícias de irregularidades e contamos com isso. Três procuradores auxiliares têm em suas funções combater as irregularidades no mundo virtual. Então não há como, pela grandeza da internet, dispensar o apoio da população.
ConJur – A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130, da Lei de Imprensa, fala que “regulamentações à imprensa ferem a liberdade de expressão”; sendo assim, a Lei das Eleições é inconstitucional?
André de Carvalho Ramos –
 Eu entendo que são dois campos totalmente diferentes. A Lei de Imprensa nasce na ditadura militar, justamente para cercear a atividade da mídia. O Supremo decidiu que isso mostrava uma intervenção indevida nos meios de comunicação. Isso não quer dizer que não há a possibilidade, por exemplo, de obter por via judicial, algum tipo de responsabilização inclusive da própria mídia. O Supremo Tribunal Federal entende que na medida em que a liberdade de imprensa serve simplesmente como uma camuflagem para um abuso que viole a igualdade, viole a liberdade do voto, esses abusos podem ser punidos. Se o Supremo reconheceu e o TSE aplica o chamado abuso dos meios de comunicação, que só significa que ali não houve liberdade de imprensa, então, no fundo, eu acho que é uma falsa polêmica, já que a liberdade de imprensa é preservada.
ConJur – O ministro Dias Toffoli tem um perfil declaradamente mais liberal com as eleições e ele diz que a Justiça só deve intervir em último caso. O doutor concorda com isso?
André de Carvalho Ramos – Tudo depende da interpretação. O espaço da democracia vai ser ocupado justamente pelos políticos, pelos candidatos e pelos eleitores, esse é o espaço tradicional. Eu não questiono da afirmação que a  Justiça Eleitoral deve permitir o entrechoque de ideias, a comunicação com o eleitor, e então o seu convencimento ou não. O outro ponto é entender que a Justiça deve ficar inerte caso haja a violação à Justiça Eleitoral. É dever constitucional do Ministério Público eleitoral provocar a Justiça Eleitoral, cumprindo o seu dever básico que é assegurar que ela seja implementada. Tanto é que seria contraditório ter as regras do jogo e permitir que elas sejam violadas. Há outro espaço para a mudança das normas. O espaço é no próprio Congresso. Por isso eu tenho a maior tranquilidade quando entro com ações de propaganda antecipada, ações de desvirtuamento de campanha partidária, ou as ações eleitorais cabíveis. Em geral, essas leis foram aprovadas com unanimidade.
ConJur – O voto deve continuar sendo obrigatório?
André de Carvalho Ramos – Essa é uma reflexão que deve ser feita em conjunto, dentro da perspectiva de uma ampla reforma política que talvez leve ao fortalecimento de partidos ou a aceitação de listas avulsas, esse é o momento de discutir o chamado voto facultativo. O que eu posso dizer é que é uma tendência das grandes democracias acabar com o voto obrigatório. Se isso acontecer no Brasil, que seja dentro de uma estrutura diferente da que temos hoje.
ConJur – No caso de voto facultativo, corre-se o risco de haver o desinteresse nas urnas?
André de Carvalho Ramos –
 Essa mudança deve fazer parte da reforma eleitoral, que sirva para combater o que aconteceu em alguns países que é o absenteísmo das urnas. A reforma tem que atrair o eleitor, combatendo o voto às cegas, mostrando que o voto vale muito a pena.
ConJur – Os presos devem continuar impedidos de votar?
André de Carvalho Ramos – A universalização do voto atingiu no Brasil um padrão mundial extremamente adequado. Essa é mais uma das reflexões da reforma política. O voto do preso provisório é o início e precisamos acelerar a implementação que está na Constituição desde 1988. No estado de São Paulo, a primeira vez que um preso provisório votou foi em 2012. A minha proposta nesse biênio é, a cada eleição, ter um número maior de seções especiais. As vantagens de trazer o voto do preso provisório é o cumprimento do texto da Constituição e a universalização ampla. O sistema prisional brasileiro é um tema que precisa ser enfrentado e adequado aos parâmetros internacionais de direitos humanos. Isso eu entendo que é um dever óbvio constitucional brasileiro, e que o Brasil peca muito por ser um dos piores do mundo. Na área dos Diretos Humanos, entendo como muito importante combater esses temas invisíveis. Em uma democracia, o voto gera visibilidade das suas demandas.
ConJur – Como as campanhas podem ficar mais baratas?
André de Carvalho Ramos – Isso envolve financiamento público privado. Os gastos aumentaram, mesmo com algumas proibições que ocorreram no passado, porque não tendo limite geram-se outros modos de fazer o marketing político. Essas campanhas, cada vez mais vultuosas, favorecem muito o sistema eleitoral no qual há as chamadas listas abertas, o quociente partidário e é preciso lutar desesperadamente para ficar acima do seu colega de partido ou de coligação. As possibilidades de diminuição de gastos envolvem a reflexão sobre uma reforma política. O eleitor deve entender que campanhas mais baratas levam em geral a um acesso maior a candidaturas com mais igualdade e que faz com que o diferencial não seja o dinheiro, mas as propostas do candidato. O dinheiro só faz com que ele seja visto e se eleja. Se o sistema for construído para que a proposta seja mais valorizada, isso terá uma consequência indireta que será o barateamento das campanhas e com isso vai ter estímulos a candidaturas que estão fora de qualquer chance de vitória.
ConJur – As empresas podem doar para campanhas eleitorais ou o financiamento deve ser exclusivamente público?
André de Carvalho Ramos – Na minha experiência em Direitos Humanos, eu vejo que até que tenhamos um mundo ideal, pequenas conquistas são melhores do que aguardar por uma grande reforma política. Proibir as empresas de contribuir já é um avanço.
ConJur – Mas então o empresário não pode contribuir?
André de Carvalho Ramos – Pode, como pessoa física. A democracia é feita com os indivíduos, não com a pessoa jurídica. É claro que a pessoa jurídica é um ente moral, é uma ficção que auxilia o capitalismo, mas não tem um papel que auxilie na democracia, tanto é que são os indivíduos que votam. Em relação ao financiamento público ou privado, não há como dar passo pequeno. Hoje o financiamento é misto. O próximo passo, se a tendência do Supremo for confirmada, é o financiamento privado por pessoa física. Esse é o passo que dá para dar. O passo seguinte é a busca da igualdade total, que as candidaturas não precisam se preocupar com questões financeiras, esse passo exige reforma.
ConJur – A Procuradoria Regional Eleitoral tem papel de protagonista nas eleições?
André de Carvalho Ramos – A atuação da procuradoria é muito importante na área eleitoral, porque a legislação permite a atuação de apenas dois atores que provocam o Poder Judiciário Eleitoral: de um lado, os políticos, candidatos, coligações e partidos, e, do outro, o Ministério Público Eleitoral. Então não há uma ação popular eleitoral, não há uma Ação Civil Pública, não há organizações não governamentais como consumidor. Nosso papel é extremamente importante, porque atuamos com independência e com imparcialidade. A sociedade civil vê justamente na nossa atuação esse equilíbrio, que não há de um lado nem aquelas ações sem lastro, que no jargão eleitoral é chamado “troca de chumbo”, entre os políticos e também não há aquela omissão de quem não entra com a ação porque teve a mesma conduta.

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